Tímido sim, sem palavras nunca

Por Agostinho Santiago Neto

O comportamento na sociedade contemporânea está atrelado a valores propostos pelo “culto à personalidade”. Seja na escola, no trabalho ou nas relações familiares, indivíduos são sempre estimulados a causar uma boa impressão. Para isso, a conduta deve ser pautada pela capacidade de se posicionar e conseguir exaltar as próprias virtudes; atingindo, assim, o “socialmente agradável”. Mas como fica os classificados como envergonhados, retraídos ou, simplesmente, tímidos?

Timere, do latim, significa “ter medo”, a palavra “timidez” caracteriza os que gostariam de mudar o comportamento por temerem as consequências dele. Equivocadamente, é muito confundido com o introvertido, devido à similaridade de temperamentos. De acordo com a escritora do livro O Poder dos Quietos, Susan Cain, “introversão” é cabível aos que não têm necessidade de mudança, não sentem falta de ser o que não são, nem receio de continuar sendo.

Subvalorizados por uma sociedade que falante e com alta necessidade de visibilidade, o atributo dos tímidos é pejorativamente identificado ao de pessoas com problemas de adaptação, relacionamento e até mesmo saúde.

Marcado pelo ideal da extroversão, o século XXI não inclui a timidez entre os seus frutos. Mas então o que a gera? O professor do departamento de psicologia da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) Marcus Túlio diz que as causas ainda são misteriosas, mas podem estar relacionadas a educação e até genética. “Boa parte do nosso comportamento apresenta certa predisposição biológica. Entretanto, o processo inicial de socialização é essencial. Uma educação rigorosa, punitiva ou crítica, para uma criança, certamente deixará marcas na sua autoestima; ocasionando o medo de se relacionar”, explicou. Túlio também menciona que crianças criadas com adultos tímidos tendem a desenvolver um perfil parecido. “Elas acabam reproduzindo e incorporando-o”, destacou.

Agostinho -timidez

Já às consequências da timidez à saúde, Túlio diz que considerá-la um fator mórbido pode ser algo relativo, visto que existem culturas e locais que normatizam os comportamentos, determinando o que é ou não saudável. “Os prejuízos começam a surgir quando há resistência a sair de casa ou se envolver em eventos sociais. Na maioria, os problemas estão relacionados à ansiedade, depressão e baixa autoestima”, relata.

A professora do Centro de Ciências Sociais da Unicap Vera Borges, ao tratar de paradigmas do Ocidente – como a competição, analisou o domínio da oratória como elemento de poder. Para ela, os tímidos disponibilizam de um recurso diferente. “Quando um professor se depara com alunos tímidos, pressupõe que gostem de escrever. Logo, essa seria outra via de expressão. Hipoteticamente, numa sociedade que valorizasse a escrita, os tímidos teriam poder”, exemplificou.

Além de bons observadores e ouvintes, o comportamento junta outras virtudes. Túlio exemplifica com a famosa timidez do músico Chico Buarque. “Podemos dizer que, em seu período musical mais fértil, a timidez o fez ficar mais com ele mesmo, produzindo músicas mais criativas. Inclusive, os estudiosos de sua obra dizem que as melhores são as que ele compôs sozinho. A solidão caba somando à originalidade”, avalia.

Para saber mais, leia.

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