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set
05

Painel do Intercom aborda o empirismo nas ciências da comunicação

Texto: Tiago Cisneiros // Foto: Micaella Pereira

O painel “Quem tem medo da pesquisa empírica? – Questões Teóricas” levou, ao auditório G2 da Universidade Católica de Pernambuco, estudantes, professores e pesquisadores interessados na relação entre empirismo e processos ou teorias comunicacionais. Das 14h às 16h, eles assistiram a palestras de François Cooren (Universidade de Montreal, Canadá), Salvato Trigo (Universidade Fernando Pessoa, Portugal) e Luiz Cláudio Martino (Universidade de Brasília). Anamaria Fadul, integrante da Comissão Científica do Intercom, atuou como mediadora. Devido à natureza bilíngue do encontro, os espectadores tiveram à disposição um sistema de tradução simultânea (português-francês e francês-português), com equipamentos individuais.

A primeira conferência, intitulada “Empirie et ventriloquie: à la recherche des voix qui nous habitent et nous animent” (Empiria e ventriloquia: em busca de vozes que nos habitam e nos inspiram), foi apresentada pelo francês François Cooren. Professor da Universidade de Montreal e presidente da International Association Communication (ICA),  entidade que reúne cerca de 4,7 mil pesquisadores da área de comunicação, ele falou sobre o conceito metafórico de comunicação como atividade de ventriloquia.

De acordo com Cooren, para se ter menos medo da pesquisa empírica, é preciso reconhecer o caráter plural e heterogêneo dos indivíduos que se comunicam. Essas vozes múltiplas não devem ser somente reduzidas aos indivíduos, podendo ser ventriquolizadas. “Quando há um comunicado oficial – da Justiça, digamos –, existe alguém falando em nome da entidade”, exemplificou, lembrando que, assim como os atores, os profissionais de mídia precisam executar suas atividades, enquanto possuem sentimentos, paixões e opiniões incompatíveis.

Para facilitar a compreensão do conceito, Cooren utilizou uma situação hipotética, um diálogo entre A e B, no qual o segundo estaria enfrentando dificuldades no relacionamento com Jorge, um colega de trabalho. O indivíduo A questiona se B está bem, ao perceber o seu ar de preocupação. A resposta de B, explicando o problema, reflete “o que o anima”, isto é, a motivação para o seu estado. Na sequência do diálogo, o professor canadense realizou uma série de observações vinculadas à ideia da ventriloquia, destacando as vozes “que habitam e inspiram” os atores da comunicação.

O professor português Salvato Trigo, reitor da Universidade Fernando Pessoa, apresentou a palestra “Ciências empíricas: método, mutabilidade teórica e nova gramática da comunicação científica”. Nela, buscou “resgatar a importância das ciêncais empíricas para a construção de uma nova gramática da comunicação, capaz de conciliar o jornalismo clássico da Galáxia de Gutemberg com as novas formas discursivas de informação e de comunicação da Galáxia Internet”.

Entre outros pontos, Trigo tratou das relações entre colonizadores e colonizados, destacando, por exemplo, que, quando aqueles impõem uma nova língua, colocam, também, um novo sistema de representação. Na conclusão, ele afirmou que o domínio do idioma continua imprescindível para a aquisição do conhecimento. “As novas formas de jornalismo, nas redes sociais e na televisão, não podem ser desculpas para a despreocupação com a língua.”

A última palestra do painel, “A Interpretação dos Dados Empíricos no Contexto das Grandes Correntes Teóricas em Comunicação”, foi ministrada por Luiz Cláudio Martino, da Universidade de Brasília. Ele lembrou que a ciência constrói um produto que não é o mesmo da filosofia, embora aquela tenha derivado desta, no século 16. “O papel do empírico é abrir uma nova possibilidade de conhecimento, a ciência”, disse. Mantendo o raciocínio, Martino estabeleceu a seguinte diferenciação: “O filósofo pode questionar de forma profunda e ilimitável o mundo e a existência. O cientista, não”. O conhecimento deste último, pontuou, origina-se de proposições que passam por um apoio oferecido por seus próprios sentidos (inclusive, a observação).

Na segunda parte da apresentação, Martino abordou a forma como as grandes correntes da comunicação constroem o conhecimento através da observação. Ele focou a sua fala nas teorias Norte-americana (ou dos Efeitos) e Crítica. A primeira, disse, é fortemente influenciada pela psicologia, com conceitos como memória, motivação e atitude, e pela sociologia, sobretudo no campo do comportamento. “A análise do processo de comunicação passa pela transformação dele em comportamento, em algo observável”, resumiu.

A Teoria Crítica, segundo o professor, também realiza esse tipo de conversão. Na vertente da Economia Política, por exemplo, as análises comunicacionais estariam assentadas sobre dados econômicos. “A informação é vista enquanto mercadoria”, diz. A Escola de Frankfurt, por sua vez, enxerga a comunicação como parte do sistema capitalista, manipulada em um processo que leva o homem à alienação e ao consumo.

Após a análise das duas teorias, Martino observou que as principais correntes não estudam a comunicação diretamente, mas, sim, convertidas em outras coisas. Isso, na sua opinião, coloca um “sério problema”: a distorção daquele que deveria ser o dado estudado. “Nossa área de conhecimento acaba se baseando em um empirismo, mas com teorias de outras disciplinas”, afirmou. Nesse sentido, ele considera que existe um impasse, cabendo ao saber comunicacional apenas duas interpretações extremas. Na primeira, ela é, simplesmente, reduzida a outros campos. A outra opção é que seja tratada como uma “pan-filosofia”, fundamento de todos os processos e capaz de explicar arte, educação e outras áreas do conhecimento. Por fim, o professor saudou os organizadores do Intercom 2011 pela escolha do tema geral “Quem tem medo da pesquisa empírica?”, que reforça a reflexão sobre a área enquanto ciência.

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