Feministas antes de ser

Amanda Timóteo tinha 17 anos à época do ensino médio, no EREM Augusto Severo, Zona Sul do Recife. Sentia inquietações sobre um “ser mulher” que ainda não sabia ao certo o que significava, mas tinha certeza que precisava descobrir. “Eu tinha um pensamento mais liberal, uma vontade. Via o empoderemento de outras mulheres e isso em estimulava”. Em meio a muitas questões, principalmente sobre como combater a violência contra mulher em sua comunidade, ela decidiu ir à Marcha das Vadias, em 2014, onde se viu cercada de identificações.

Os cartazes gritavam vozes que de alguma forma já nasceram com Amanda, independente de uma consciência feminista ou do quanto ela sabia sobre feminismo. “Eu olhava para todos os lados e me sentia contemplada. E pensava ‘caramba, essa galera tem a mesma ideia que a minha’. Descobri que o que eu estava pensando não era mentira e tinham outras mulheres junto comigo”, afirma. Era o início de uma jornada ao lado da Marcha que dura até hoje, garante a jovem de 19 anos, quando conta seu dia-a-dia de construção do empoderamento da própria mãe e até da vizinha, suas “companheiras”.

De dentro para fora, das indagações individuais a um sentimento coletivo, assim foi com Ju Dolores, de 31 anos. Não havia algo que pudesse classificar como reflexões a respeito do feminismo, mas a lembrança de dez anos atrás reforça seu ativismo à frente da Marcha das Vadias atualmente. “Eu estudava, já trabalhava, buscava independência. Na minha casa, eu tenho um irmão quase da minha idade, à época ele tinha onze anos, eu brigava para que as nossas atividades domésticas fossem iguais. Eu não nomeava isso de feminismo, mas sim de injustiça”.

Ju não previa um processo de total modificação em sua vida quando decidiu, em 2012, ir à Marcha. Como Amanda, ela descreve um choque ao perceber que o debate era justamente sobre o que já havia pensado inúmeras vezes, entendia os cartazes e os gritos, sentia que era feminista antes de ser. “Ter voz foi uma das coisas mais incríveis que me aconteceram. Quando eu falava alguma coisa e outra pessoa dizia “eu quero saber o que Ju acha”, quando a sua opinião é importante e as coisas que você vive contam também. É um caminho sem volta, eu diria”.