Sabor (e amor) à mesa

Por Marina Meireles

É domingo. O aroma da dobradinha atrai quem está na casa da família Arôxa Cruz para fazer o prato do almoço. Seja parente ou agregado, todos sentam-se à mesa e concentram-se na comida.  Dividem o alimento, o espaço, o assunto da conversa. A prática de compartilhar o momento da refeição, por si só, não carrega consigo a suntuosidade de uma festa ou de um rito importante de passagem. Uma refeição, por si só, pode ser facilmente esquecida após a digestão. Entretanto, nesse e em outros tantos núcleos familiares, o momento esconde detalhes profundos, perceptíveis somente depois de uma reflexão sobre os tempos atuais: quantas outras pessoas conseguem se reunir para um simples almoço em família?

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Na era das mensagens instantâneas e dos seriados on-demand, é quase impossível reunir pais e filhos num mesmo ambiente para comer. O expediente que não termina no local de trabalho e acompanha os profissionais através das notificações de e-mail e de mensagens no celular também contribui para a banalização do singelo ritual de compartilhar o momento da refeição com quem está próximo. Ao contrário do que promete, a tecnologia rouba minutos preciosos de interação social.

Com a ilusão de que poupar tempo para comer é algo positivo, ainda há quem opte pelo fast-food, que ganha no quesito tempo, mas perde no quesito sabor. Os hot-dogs e Big Macs – por vezes murchos e sem sabor – podem até anular a fome do sujeito, mas não substituem a graça de degustar, um prato saboroso ao lado de boas companhias. Tal qual Câmara Cascudo diz em sua obra sobre A História da Alimentação no Brasil, “falta à mesa a ação catalítica daquela cerimônia tranquila que é a refeição. Perde-se a continuidade na padronização do cachorro de qualquer temperatura e do sandwich de qualquer coisa”.

Em algumas mesas, por outro lado, a situação é diferente.  Os quitutes recém-saídos da panela carregam, no cheiro e no sabor, os toques do carinho com que foram preparados. Segundo a pedagoga Kátia Arôxa, dona do tempero que atrai a família inteira, essa tradição de reunir todos à mesa segue firme desde sua infância. “Antes nós nos reuníamos na casa da minha avó e depois na casa da minha mãe, mas quando ela morreu, a família toda passou a vir para cá. Aqui, todo mundo já sabe que tem sempre um bolo ou um café”, conta. Para ela, a dedicação à cozinha é uma forma de demonstrar amor a quem saboreia seus pratos.

Segundo o antropólogo Artur Peregrino, a reunião para compartilhar o momento da refeição significa, também, resgatar os valores do contato social entre familiares e amigos. “Quando você quebra a dimensão da mesa, você quebra o convívio entre as pessoas e essa interação através do diálogo entre os familiares”, explica.

No caso da estudante de Engenharia Ambiental Beatriz Santiago, a mesa está na casa dos pais, no município de Ipojuca, e nas feiras de comida vegetariana que costuma frequentar. Há pouco mais de seis meses sem carne e derivados de animais no cardápio, ela acredita que sua escolha alimentar não é um empecilho para vivenciar momentos especiais ao lado de quem ela gosta. “Eu sou a única vegana da minha família, mas quando estou em casa, sempre me reúno com os meus pais para comermos”, conta. Quando está longe dos pais, os momentos de partilha de alimentos acontecem entre amigos. “Procuro produtos mais naturais, preparados sem conservantes. Tenho amigas que estão buscando a mesma coisa e aproveitamos para procurar opções juntas”, conta a estudante.

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