A SOLIDARIEDADE MORA AO LADO

Como os vizinhos se ajudam uns aos outros garantindo uma vida melhor em meio às dificuldades

O ser humano tem como uma de suas principais características ser sociável. E uma das formas primordiais de socialização é com os vizinhos. O conceito de vizinhança é intrínseco ao conceito de sociedade, já que numa sociedade as pessoas se alojam numa mesma região geográfica, pelos mais diversos motivos. Nos primórdios da civilização as comunidades se compactavam para aproveitar melhor os recursos da área e se ajudarem na defesa de suas próprias vidas contra predadores e desastres naturais. Atualmente, após a consolidação das metrópoles, a vizinhança adquiriu um status cultural e econômico: as comunidades são delimitadas de acordo com a origem social e a condição financeira de seus indivíduos.

Esse fenômeno é altamente observado na sociedade pernambucana, em especial na Região Metropolitana do Recife, onde observamos que nos bairros de maior poder aquisitivo os indivíduos costumam ser mais reservados, se limitando às convenções sociais e deixando clara a falta de intimidade para com os moradores das proximidades. Até mesmo a estruturação desses bairros, compostos de edifícios ou casas com maior isolamento devido à insegurança da cidade exprime essa característica. Belquice Fiel, 58 anos, mora no bairro da Tamarineira há dois anos e disse ter uma certa dificuldade de convivência com a vizinhança da região. “Desde que cheguei aqui na Tamarineira não tenho intimidade com praticamente ninguém, só falo bom dia, boa tarde ou boa noite com os vizinhos do prédio onde moro. Nunca tive problema com ninguém aqui, mas sinto esse distanciamento”, relatou Belquice.

Já nos bairros de origem mais popular, em especial nos de origem mais antiga, a cooperação entre os vizinhos é vista com uma frequência muito maior. Um exemplo é o bairro de Ouro Preto, na cidade de Olinda, onde as dificuldades ocasionadas pela falta de estrutura da comunidade fazem com que os moradores de uma mesma rua ou de ruas próximas se unam em busca de melhorar a qualidade de vida de todos. A dona-de-casa Ivana Borba, 52 anos, e o aposentado Ivanildo Monteiro, 59 anos, que possuem suas casas separadas apenas por um muro, são um exemplo de como a cooperação pode ser benéfica para ambos. Eles se uniram com outros moradores das redondezas e, por conta própria, realizaram melhorias coletivas como a perfuração de um poço artesiano e muros de arrimo. “Sofremos bastante com a falta d’água, então resolvemos nos juntar para construir o poço, e hoje temos água 24 horas por dia nas nossas casas”, comentou Ivana.

Aliás, é justamente um muro, o que separa as duas casas, a principal forma de comunicação entre os dois vizinhos. Ivanildo conta que através desse muro eles colocam a conversa em dia sempre que podem, assim como trocam utensílios que às vezes emprestam um ao outro. “É até engraçado, praticamente todo dia eu escuto os gritos dela chamando por mim ou principalmente pela minha irmã Inês, que mora comigo. Muitas vezes ela é até mesmo nosso despertador”, brinca Ivanildo. Ivana reconhece a importância dessa cooperação, que ocorre também entre eles e outros vizinhos em comum. “Aqui a gente sempre se ajuda, um chama o outro sempre que precisa, e em mais de sete anos que eles vieram morar aqui nunca tivemos nenhum desentendimento”, afirmou.

As vizinhas Lenice França, 76 anos, Maria Lira Alves, 74 anos, e Cleide Pereira, 58 anos, moram na mesma rua há cerca de 45 anos e contam como a união se mostrou essencial ao longo do tempo para a boa convivência e até mesmo para a melhoria das condições do bairro. “Moro aqui por todos esses anos e nunca discuti com os vizinhos. Criamos os filhos, criamos os netos, e todos convivem muito bem”, afirmou Lenice. Cleide lembra de como era o bairro quando ele surgiu. “Quando a gente chegou aqui não tinha nada. As ruas eram de barro, não tinha estrutura. Hoje em dia a situação do bairro está bem melhor, em grande parte pela nossa mobilização junto à prefeitura. O problema é a falta d’água, mas a gente sempre se ajuda”, comentou Cleide. Maria é categórica ao afirmar o quanto gosta do bairro e da vizinhança. “Só saio daqui dentro do meu caixão”, enfatizou.

Lenice também relatou como os vizinhos se organizavam para tentar fazer festas comemorativas para a diversão dos moradores no carnaval, nas festas juninas ou no final do ano. “As festas eram ótimas, sempre no meio da rua, com todo mundo compartilhando. Os vizinhos se reuniam, todos cooperavam, e fazíamos blocos de carnaval, quadrilhas juninas e pastoris. Se a idade e a saúde me permitissem, eu continuaria fazendo até hoje”, lembrou saudosamente.

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